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Número de espécies descritas na costa brasileira pode chegar a 13 mil

Editoria: Vininha F. Carvalho 08/11/2013

A mais recente revisão publicada sobre a biodiversidade da zona costeira e marinha sul-americana – divulgada em 2011 na revista PLoS One – aponta a existência de 9.103 espécies diferentes de animais, plantas e algas já conhecidas em águas brasileiras.

Mas o número pode chegar perto de 13 mil espécies descritas, segundo Maria de los Angeles Gasalla, professora no Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO/USP).

A afirmação foi feita durante o penúltimo encontro do Ciclo de Conferências 2013 do BIOTA-FAPESP Educação, organizado pelo Programa de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Recuperação e Uso Sustentável da Biodiversidade de São Paulo (BIOTA), ocorrido na quinta-feira (24/10).

Gasalla comparou os dados do artigo publicado na PLoS One por Patricia Miloslavich, pesquisadora da Universidad Simón Bolívar, da Venezuela, e colaboradores, com números provenientes de revisões recentes feitas por pesquisadores brasileiros.

O levantamento coordenado por Miloslavich abrangeu tanto a costa do Atlântico como a do Pacífico, na América do Sul, e foi realizado no âmbito de um projeto internacional conhecido como Censo da Vida Marinha, que teve início no ano 2000 e levou cerca de dez anos para ser concluído.

Em relação à plataforma marítima brasileira, o trabalho destaca o grupo dos crustáceos, com 1.966 espécies conhecidas, como o de maior diversidade, seguido pelos moluscos (1.833), peixes (1.294) e poliquetas (987) – juntos, segundo o artigo, esses animais correspondem a 66,79% da biota marinha conhecida no Brasil.

“Esses números, a princípio, pareciam até mais elevados do que algumas estimativas anteriores. Mas, avaliando o artigo profundamente, percebemos que estão subestimados. Somando dados de trabalhos recentes feitos por pesquisadores brasileiros, chegamos ao número de 10.804 espécies diferentes apenas no que diz respeito à fauna marinha. Se considerarmos também a flora, o número pode chegar perto de 13 mil espécies”, afirmou Gasalla.

De acordo com a revisão da literatura compilada por Gasalla, o número de espécies de crustáceos descritos na costa brasileira atingiria de 3.335. Além disso, já seriam conhecidas 1.886 espécies de moluscos, 1.420 de peixes e 987 de poliquetas.

Os cientistas não sabem ao certo qual é a porcentagem da biota marinha ainda desconhecida no Brasil. Acredita-se, no entanto, que esta seja muito alta e que muitas espécies poderão desaparecer antes mesmo de serem descobertas.

A pressão antrópica – o impacto causado por atividades humanas como poluição, degradação de habitats por empreendimentos econômicos, expansão do turismo desordenado, introdução de espécies exóticas e atividade pesqueira não manejada – é considerada a principal ameaça à biodiversidade da chamada Amazônia Azul (a costa brasileira).

A zona marinha do país abrangia originalmente uma área de 3,5 milhões de quilômetros quadrados. Com a extensão da plataforma continental solicitada pelo Brasil à Organização das Nações Unidas (ONU) na última década, a extensão da Amazônia Azul passou para 4,5 milhões de km2.

Um estudo apresentado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2010 apontou que 40% desse território corresponde às áreas definidas como prioritárias para a conservação da biodiversidade.

No entanto, segundo Gasalla, apenas 1,87% da zona marinha brasileira está protegida em Unidades de Conservação, sendo que em torno de 10% já foram licenciados para a exploração de petróleo e gás natural.

“A porcentagem de área protegida chega a 1,87% se forem considerados apenas os 3,5 milhões km2 originais da zona marinha; caso contrário, o número é ainda menor.

Além disso, alguns estudos mostram que diversas Unidades de Conservação não foram delimitadas criteriosamente na sua implantação, seja do ponto de vista científico ou das comunidades locais, e algumas existem do ponto de vista burocrático, mas não funcionam na prática”, avaliou a pesquisadora.

Uma das metas acordadas em 2010 durante a Conferência das Partes das Nações Unidas (COP 10), da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), realizada na cidade de Aichi, no Japão, é de que até 2020 pelo menos 10% das áreas marinhas e costeiras consideradas de especial importância para a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos tenham sido incluídas em sistemas de áreas protegidas.

“Não adianta, porém, sair criando áreas de proteção por meio de decretos para atender, supostamente, metas de tratados. A parte política da conservação deve caminhar junto com a fundamentação científica e com o contexto social.

O processo precisa ser embasado pelo conhecimento científico, além de envolver efetivamente as comunidades locais que utilizam o mar como meio de sobrevivência, caso contrário, além de não funcionar, pode criar problemas ainda maiores”, alertou Gasalla.

O uso sustentável de recursos naturais marinhos para atender necessidades humanas de alimentação e renda por meio da pesca e aquicultura também foi mencionado por Gasalla.

A professora enfatizou a importância do manejo com objetivos claros para a pesca e aquicultura de modo a garantir níveis sustentáveis das populações marinhas, mitigação de impactos colaterais, viabilidade econômica, e equidade social.

"Para isso, a ciência pesqueira deverá ser mais desenvolvida no Brasil, assim como ouvida pelos tomadores de decisão no que diz respeito à manutenção dos níveis de intensidade pesqueira necessários para atingir esses objetivos”, disse.


- Mudanças climáticas:

Outro tema debatido pelos participantes do penúltimo encontro do Ciclo de Conferências 2013 do BIOTA-FAPESP Educação é o fato de que as áreas prioritárias para conservação nos oceanos podem mudar nos próximos anos em razão das mudanças climáticas.

“Com o aquecimento das águas marinhas, algumas espécies podem migrar para regiões mais frias, por exemplo. Discute-se hoje a possibilidade de criar áreas de proteção móveis nos oceanos”, afirmou Mariana Cabral de Oliveira, pesquisadora do Instituto de Biociências da USP.

Além disso, lembrou Oliveira, a acidificação das águas – também decorrente do aumento nas emissões de dióxido de carbono (CO2) ¬–poderá afetar fortemente espécies algas calcárias, conhecidas como rodolitos, existentes principalmente na região do Espírito Santo e da Plataforma de Abrolhos, na costa da Bahia.

Segundo artigo publicado por pesquisadores brasileiros na revista PLoS One em 2012, os bancos de rodolitos em Abrolhos cobrem uma extensão de mais de 20 mil quilômetros quadrados, comparável à área do estado de Sergipe e da grande barreira de corais da Austrália.

Cada rodolito funciona como um minirrecife, que serve de abrigo para pequenos invertebrados. “Alguns depósitos de rodolitos têm dezenas de metros de profundidade. Essas algas apresentam uma parede rija, com deposição de carbonato de cálcio, que vai crescendo camada por camada. Nesse processo, as algas aprisionam o CO2 da atmosfera”, contou Oliveira.

A acidificação dos oceanos não apenas impede o processo de calcificação das algas como pode dissolver as paredes calcárias já existentes, fazendo com que todo o CO2 ali aprisionado seja liberado novamente na atmosfera, alertou Oliveira.

“A estimativa é que existam cerca de 200 bilhões de toneladas de carbonato de cálcio nesses depósitos de rodolitos no Brasil, o que corresponde a 88 bilhões de toneladas de CO2. Claro que isso não vai ser liberado de uma vez, pois alguns depósitos são muito profundos e a ação ocorre de cima para baixo”, disse.

O terceiro palestrante do encontro foi Roberto Berlinck, professor do Instituto de Química de São Carlos da USP (IQSC/USP), que apresentou diversas moléculas com atividade farmacológica isoladas em organismos marinhos.

Entre os exemplos mencionados estavam a esqualamina, isolada de tubarão da espécie Squalus acanthias, que demonstrou ação antifúngica e antitumoral. E também a pseudopterosina, anti-inflamatório produzido por corais da espécie Pseudopterogorgia elisabethae e já usado em uma linha de cosméticos.

Berlinck também ressaltou o grande desconhecimento sobre a microbiota marinha em todo o mundo. Segundo ele, apenas em 2002 começaram a surgir os primeiros relatos de diversidade microbiana marinha, pois as bactérias do ambiente marinho são extremamente difíceis de serem cultivadas pelas técnicas tradicionais.

“Pesquisadores americanos desenvolveram métodos especiais para isolar esses microrganismos e descobriram que um único táxon, o grupo de bactérias SAR11, corresponde a 40% do número de células de bactérias marinhas. É impressionante”, afirmou Berlinck.

Fonte: Karina Toledo / FAPESP